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Roselaine Monteiro Moraes
Gestora de Políticas Públicas Sebrae RS
A cultura maker tem como princípio a ideia de que o ato de consertar, modificar, criar e produzir objetos pode ser feito por qualquer pessoa. Faça você mesmo, esse é o propósito! A ideia do “fazer” já é hoje uma realidade que sustenta a inovação em escolas, em projetos sociais e no mundo de trabalho.
A adoção de novos formatos de ensino e aprendizagem que prevejam ambientes colaborativos e que permitam a discussão de ideias e a possibilidade de prototipação de projetos tende a chamar a atenção dos alunos. Nessa perspectiva, a cultura maker associada ao ensino sobre empreendedorismo pode ser uma boa estratégia para tornar jovens mais engajados e conectados com o futuro do trabalho.
Maior capacidade de adaptação, inovação e reinvenção são tendências a serem perseguidas por indivíduos que pretendem aumentar suas chances de sucesso profissional, seja na busca de um emprego ou no ato de empreender em negócios.
Independentemente da escolha profissional, o mundo do trabalho vem exigindo cada vez mais competências (conhecimentos, habilidades e atitudes) que poderão ser muito úteis na vida dos jovens. Assim, noções de liderança, trabalho em equipe, planejamento, gestão e finanças, pensamento ético e sustentável, capacidade de identificação de oportunidades, criatividade, relacionamento intra e interpessoal, iniciativa, visão, capacidade mobilização de recursos e pessoas, lidar com incertezas, associados a um aprendizado pela prática (cultura maker), são elementos que dialogam com as competências do ensino no meio escolar.
Nessa perspectiva, a Base Educacional Comum Curricular – BNCC, criada pelo Ministério da Educação em 2018 reconhece a importância de desenvolver nos alunos, ao longo da escolaridade básica, um conjunto de competências que vão ao encontro do ensino sobre empreendedorismo.
Então, a escola é um espaço de grandes possibilidades de estímulo ao protagonismo juvenil. Projetos que visam a resolver problemas do cotidiano favorecem a interação entre os jovens, e isso pode estar associado a novas tecnologias.
Um exemplo é um projeto desenvolvido por pesquisadores e alunos da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), que pretende apresentar em três escolas de tempo integral da rede pública de Coari e Itacoatiara e em uma na capital Manaus a formação técnica e profissionalizante a professores e a 90 estudantes, contemplados por bolsa de Iniciação Científica Júnior nas áreas de: robótica, programação e automação. Os módulos devem compor parte do quadro de disciplinas eletivas necessárias previstas na Base Educacional Comum Curricular e serão desenvolvidos numa dinâmica do que hoje é conhecida como cultura maker.
Nos anos 50, o educador brasileiro Anísio Teixeira (1900-1970), considerado o principal idealizador das grandes transformações pelas quais passou a educação brasileira no século 20, já entendia a importância de a escola considerar a ideia de um indivíduo criador com necessidades de cooperação mútua.
A cultura do fazer conectada à tecnologia surgiu nos anos 70, junto com o computador pessoal. Mas o termo ‘maker’ ganhou o significado atual na primeira década dos anos 2000. Em 2006, a revista Maker, criada pelo norte-americano Dale Daugherty, realizou a feira Maker Faire, que se transformou em ponto de encontro anual de entusiastas e adeptos do movimento pelo mundo. Para Daugherty, a cultura maker é “um tipo de renascença”, devido ao seu poder de transformação da educação, do indivíduo e da sociedade.
Assim, não há como pensar o futuro da educação sem a ideia da cultura maker agregada a novas tecnologias e competências empreendedoras. Por isso, o projeto desenvolvido no Amazonas aponta para um futuro bastante próximo. A pesquisadora e professora doutora Marisa Cavalcanti entende que os muros da escola não estabelecem mais limites para o aprendizado. E destaca que pesquisas em psicologia e neurociências hoje influenciam tanto na estruturação de novos currículos quanto na forma de ensinar.
Os avanços na área educacional devem levar em consideração elementos como a arquitetura do local, a distribuição dos estudantes na sala de aula, a importância das atividades em grupo e a maior interação entre eles, fundamental para a troca de conhecimento e para facilitar a exposição de todos, incluindo os que apresentam mais dificuldade de comunicação. Esses elementos estão presentes quando se trata do desenvolvimento de competências empreendedoras.
É desse modo que a cultura maker surge como grande potencial transformador, segundo a pesquisadora: diante das necessidades educacionais das novas gerações de migrarem do modelo educacional instrucional, ainda em vigor em boa parte das escolas, para um modelo baseado no conceito de learning by doing, ou seja, aprender fazendo.
A cultura maker pode representar um imenso desafio para os professores, principalmente no que tange às questões baseadas em tecnologias digitais, além do estilo de condução de uma aula. Aulas de gamificação e robótica, por exemplo, são diferenciais no cardápio de competências dos professores do futuro. Para metodologias mais inovadoras – tais como Metodologias Ativas (aprender por experiência), Sala de Aula Invertida (aluno estuda antes o conteúdo básico e o professor aprofunda) e o desenvolvimento de projetos -, o professor precisará adotar uma nova postura frente à construção de saberes. Se antes era só professor que ensinava, agora essa construção deve considerar a bagagem de conhecimentos do aluno. Nesse sentido, professores e estudantes estão juntos no processo do aprendizado, reforçando a ideia de construção coletiva, propiciando que todos ensinem e aprendam juntos.
Outro bom exemplo vem de São Paulo, do Colégio Dante Alighieri, instituição centenária, que criou em 2018 o FabDante, um espaço para criatividade, inovação e fabricação digital e artesanal com tecnologia de ponta. O objetivo é que o laboratório seja utilizado pelos alunos do Ensino Médio para a criação de protótipos, realidade aumentada, produção digital, softwares e hardwares. Nesse projeto os estudantes têm acesso a computadores, impressoras 3D, serras manuais e elétricas, cortadora a laser, máquinas e equipamentos de costura e bordado, equipamento para gravação de vídeos, kits de prototipação eletrônica, automação e robótica, entre outras ferramentas.
Quem nunca se questionou: para que aprender tal coisa, onde vou usar isso? Muitas vezes, o estudante, por não conseguir fazer conexões com a sua realidade, não percebe valor naquilo que o professor ensina no quadro (teoria), encontrando eventualmente dificuldade em aprender. Isso pode gerar frustração e desinteresse no tema, fazendo ecoar cada vez mais esse questionamento em relação à visão do ensino.
A cultura maker pode ajudar a desmistificar essa visão. A exemplo disso, o aluno, quando passa pela experiência em criar um robô, precisará desenvolver um raciocínio lógico e matemático, onde necessitará ter um olhar global do processo que envolve: planejamento, criação e programação de comandos. Assim, esse aluno terá acesso a um universo de descobertas que poderão dar sentido ao seu aprendizado. Quando o estudante “enxerga” a física, a matemática, a geografia, e outros conteúdos se encaixando na sua construção cognitiva, ele pode passar a entender para que serve aprender sobre “tal coisa”. Aqui essa aprendizagem ganha sentido.
Desenvolver a capacidade criativa, o pensamento computacional, e o incentivo à pesquisa são fundamentais na escola do século 21, avalia Marisa. Mas tão importante quanto essas habilidades é também o comprometimento social que todos devem ter com as questões educacionais da comunidade local e do país. Este será não só o empreendedor do futuro, que já pode ser vislumbrado em exemplos do presente. E ao que tudo indica, são tendências que marcarão a área educacional.
Quer saber mais? Confira:
O que a cultura maker tem a ver com a educação
Piloto na Escola Municipal Jorge de Resende Sobrinho e Ufam
Sala de aula invertida e a educação do futuro
BACIGALUPO, Margherita et al. EntreComp: The entrepreneurship competence framework. Luxembourg: Publication Office of the European Union, 2016.
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